Essa semana faz cinco anos que eu perdi meu segundo bebê. Era Outubro de 2013. Minha filha mais velha, a Marina, tinha 1 ano e 7 meses quando descobri que seria mãe novamente! Ficamos tão felizes! Naquele momento que eu vi os dois tracinhos no teste de farmácia, eu não poderia imaginar a longa jornada que marcaria a vida de toda nossa família.
O HCG não estava evoluindo como esperado, e passei um período de incerteza, com esperança de um milagre acontecer mas, no fundo, sabia que meu bebê não iria se desenvolver.
Eu lembro do meu choro, do escuro do quarto, da solidão.
Eu perdi meu terceiro bebê, meu quarto bebê e meu quinto bebê. Meus quatro filhos. Desejados e amados! E eu lembro do meu choro e da minha solidão quando perdi cada um deles.
Como é difícil viver a dor do luto e da infertilidade ao mesmo tempo. Do meu corpo que não era capaz de gestar um filho. Eu travei uma incansável luta em busca de respostas e me submeti até a tratamentos experimentais. Eu estava obstinada a gestar e parir!
Os sentimentos eram confusos e no meio disso tudo tinha a Marina, que não entendia porque seus irmãos iam embora tão cedo. Meu marido me acudia, amparava e silenciava sua tristeza para me dar forças.
Mas nós conseguimos! Nossa bebê arco-iris nasceu em Setembro de 2016. Linda e saudável, num parto cercado de amor e carinho. Ela nos trouxe uma imensa alegria. Mas existia um vazio em nossas vidas que não conseguíamos cuidar.
Não existe na sociedade lugar para o nosso luto. Pais de quatro bebês que viveram no 1º trimestre de gestação. Para a Medicina e para a Sociedade, sofrer por eles é bobagem! Mas o que fazemos com esse vazio e essa falta de lugar?
No primeiro ano de vida da Maria Sayuri, descobrimos através do Grupo SobeViver um ritual Budista que acolhia os nossos bebês. Meu marido é japonês e vem de família budista, mas não conhecia essa prática. Então nos informamos e começamos a buscar formas de realiazar essa homenagem aos nossos filhos.
Foi um processo longo de compreensão e entrega. De cumplicidade e companheirismo. E, acima de tudo, um processo cercado de amor! Que possibilitou não só a nós, pais dos bebês, resignificar e vivenciar o luto, como também ajudou a família a aprender como nos acolher de maneira empática e reconhecer nossos bebês como parte integrante da família.
Mizuko, que significa filhos d’água, é um ritual em homenagem aos bebês que foram perdidos durante a gestação. Os pais vão até o templo e levam brinquedos, roupinhas e prestam homenagens ao filho. Como não há esse templo específico no Brasil, decidimos fazer o nosso cantinho em casa para homenagear e honrar nossos filhos.
Primeiro escolhemos os budas, depois eu costurei as roupinhas, o papai construiu a casinha e assim montamos o cantinho dos nossos pequenos. O último detalhe foi colocar o Catavento: o sopro da vida. Entendemos que, cada um deles, que habitaram meu ventre, é um ser único que merece respeito. São parte da nossa história, de quem somos e da nossa família. Não importa o tempo que eles ficaram conosco, mas sim que estarão para sempre em nossos pensamentos e em nossos corações.
Encontramos um lugar para a nossa dor, resignificamos nosso luto e completamos nosso ciclo. A Marina, que ficava com os sentimentos confusos por ter perdido os irmãos, hoje compreende esse luto. Não é assunto velado, é dor ressignificada.
E assim aprendemos a seguir, com dor, pois ela não vai embora, mas juntos. Pois somos oito…
Se quiser saber mais sobre o Mizuko Kuyo, leia o artigo Perda gestacional na cultura japonesa e o Mizuko Kuyo
Fico contente que uma matéria que redigi explicando a cerimônia do Mizuko-kuyo, prática do budismo japonês em homenagem aos bebês perdidos durante a gestação, tenha inspirado outras mães a buscar formas de homenagear seus filhos.
A matéria “Perda gestacional na cultura japonesa e o Mizuko Kuyo” foi escrita por mim o ano passado após passar por uma perda. Após isto fiz um blog só explicando nos detalhes desta prática.
Acho importante para os pais que perderam filhos durante a gestação realizarem uma espécie de ritual para marcar a passagem de seu bebê e prestar suas homenagem. Psicólogos dizem que rituais de despedida são importantes para fechar ciclos. Alguns pais fazem isto plantando uma árvore, soltando balões, fazendo caixa de recordações, acendendo uma vela, fazendo uma tatuagem…
Infelizmente a perda gestacional ainda é um tabu, as pessoas falam disto de maneira velada.
Espero que o Mizuko-kyuo possa inspirar mais pais.